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Fadas modernas

A portrait of a young caucasian couple in love
Casal de costas

Foto: PureStock / Diomedia

Entre todas as coisas que uma garota pode querer, duas lideram o ranking: uma pele sem espinhas e um namorado. Não foi diferente com a Rafaela. Ela passou mais de oito meses buscando o garoto ideal. Entre procuras reais e virtuais, esforçou-se em trabalhar pela própria sorte. Começou frequentando as melhores festas, vestindo a dupla impecável: a mini-saia preta e a blusa branca de renda. Nos intervalos da escola, posicionava-se na vitrine: entre a arquibancada da quadra de basquete e o bar, estrategicamente na passagem dos meninos mais gatos. Iniciativa? Não chegava a tanto. Ela evitava o constrangimento de abordar um menino. Afinal, perderia a graça entregar tudo, sem esconder nada. A graça está no mistério, repetia a si mesma, enquanto trocava olhares discretos com um ou outro nas festas e no intervalo. Sua timidez ajudava na postura passiva. Antes eles, depois a gente, explicava às amigas mais rapidinhas, que insistiam em ganhar, justamente, na insistência. No íntimo, Rafaela torcia para estar certa disso. É verdade que, muitas vezes, desejava gritar, sem escrúpulos: olha eu aqui, linda e loira, disposta a me apaixonar. Mas controlava-se. Nós, mulheres, ainda não viramos homens, era outro de seus mantras amorosos, sempre memorizado em favor da paciência e do tempo natural de cada etapa da vida.

Apesar da resistência em acelerar o jogo da conquista, Rafaela não perdia chances e mantinha-se alerta. Por isso, poucos meses antes de fechar um ano do projeto namorado, um dia inesquecível marcou o seu calendário. Foi na praia, no último doze de Janeiro, que conheceu Eduardo. Quem diria: apresentado pela amiga da melhor amiga de sua mãe. Ele estava sozinho – ou seja, sem os amigos – passando a semana numa casa alugada no condomínio vizinho ao de Rafaela. Pertinho assim.

O primeiro encontro foi na beira do mar. Básico. E lindo. Rafaela levou a trupe para dar apoio (mesmo que temesse a investida de Bianca, uma amiga um tanto carente). Fizeram uma espécie de luau, sem violão nem lua, mas quem se importava? A conversa preencheu a noite junto ao som do mar. E os sorrisos cúmplices dos dois recém-conhecidos completaram o calor da lua, que, apesar de sua cor fria, sempre iluminou o mundo de romantismo. O primeiro beijo aconteceu naquela mesma noite: a mão no rosto, os lábios em comum desejo. A química foi recíproca e os raiozinhos de paixão invadiram seus corpos em arrepio. O novo casal grudou-se de tal forma que, ao perceberem, ainda caminhavam pela areia às sete horas da manhã. O sol nasceu e inaugurou a melhor madrugada da vida de Rafaela.

Tudo perfeito, não fosse a despedida. Ele retornava à cidade algumas horas após o inesperado (ou tão esperado!) encontro. Nas semanas seguintes, ela quase enlouqueceu de saudade. E passou dias ansiosos, a ponto de levar um longo tempo para dormir e de precisar de pouco para despertar. Misturava sonho e realidade: lembrava do beijo e dos carinhos de Duda, da risada macia ao andarem de mãos dadas com a intimidade de um namoro antigo. Passaram-se semanas em que ela checava diariamente as atualizações de Eduardo na internet e trocava mensagens quase intermináveis com ele. Declarações digitais. E a saudade de seus olhos e de sua pele marcou um período na vida de Rafaela em que nada mais fez sentido e do qual nada mais guarda lembrança. Ela sentia-se perturbada, tanto quanto um ser apaixonado pode ficar. A paixão nos anormaliza durante os eternos minutos de sua existência, filosofava, solitária, esperando as horas passarem.

Volta às aulas e a grande data chegou. O reencontro acendeu novos momentos. Duda ligava e eles geralmente marcavam depois do colégio, no parque mais próximo ou na casa da Bianca (que se tornou uma confidente dedicada, para a surpresa de Rafaela). Logo depois, vieram encontros mais interessantes, na casa do Duda e no cinema. As semanas correram num ritmo acelerado de reconhecimento sobre as músicas que tocam no iPod, os livros e filmes preferidos e os planos para um futuro brilhante. Aqueles dias se tranformaram em meses, quando o relógio do coração passou a criar expectativas e, Rafaela, a esperar pela evolução.

Foram muitos dias de espera. Afundada em dúvidas sobre o amor de Duda, Rafaela sentia a falta de uma certeza específica, pontual. Uma mudança que faria a diferença e revelaria o significado de tudo aquilo. E, no dia em que conseguiu o que tanto desejava, saiu uma espinha bem no meio da sua bochecha esquerda. Mas, incrivelmente, aquela espinha vermelha não foi problema. Eduardo Beck mudou o status para Relacionamento Sério.

Importante era que, partir de agora, o conto de fadas começava a ser oficialmente escrito.

Annie Müller é apaixonada por Shakespeare e sua citação preferida do escritor ingles é “Vem, sente-se ao meu lado e deixe o mundo girar. Jamais seremos tão jovens”. Escreva para a autora em @anniepmuller

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