texto por Isabelle Costa (@avalancheliteraria)
ilustrações por Thais Menezes (@thamenezes.s)
Tudo começou em dezembro, quando decidiu ser importante cortar o cabelo. Não era algo de hábito, nem ato que rendia o maior dos prazeres, mas era necessário. Abril, maio e agosto precisavam ir embora, e apesar de que tivesse tentado expulsá-los de si de tudo quanto fora jeito, era no cabelo que eles gostavam de se esconder.
O motivo de não ter conseguido antes era a conhecida mania de colocar significado em coisas que são só coisas. Abril era um instinto; maio, quase. Agosto era tudo, e virou, também, eco — das pontas até a raiz, do jeans até a pele, já que não gostava das coisas em ordem. E foi assim, fora de ordem, que ela ficou.
Tudo começou em dezembro, mesmo que já tivesse começado bem antes: os fios caindo no chão que não conhecia, o barulho da tesoura rompendo a conexão. As mãos procurando aquilo tudo que se estendia até o meio das costas — que todo mundo adorava, que era o mais bonito que tinha pra oferecer — pra não achar.
O cabelo fora com quem abril conversara. Maio o enrolou na ponta dos dedos, como se as mechas tivessem nascido exclusivamente para isso. Agosto tateou, afagou: descobriu como era ter as mãos ali, e ela gostou. Mesmo em pouco tempo, pensou até ter se acostumado. Mas a única coisa que ficou, quatro meses depois, foi a sensação. Até vir dezembro, o dia primeiro, desfazendo todos os símbolos.
Quatro, cinco, oito. Eram meses, se transformaram em dedos. Se não cortasse naquela hora, talvez nunca mais conseguisse o ímpeto que as pessoas precisam para não se alimentarem mais daquilo que as impedem de voar. Foi decisão sábia, e teve certeza no instante em que o espelho confirmou que as mechas esparramadas no chão de taco eram suas.
Tudo começou em dezembro, quando já deveria ter terminado.
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