Imagine que você está assistindo sua série ou seu filme favorito, super envolvido em uma aproximação de dois personagens do mesmo sexo – que tem tudo pra ser um romance inevitável – e… eles não ficam juntos. Pelo contrário, as duas pessoas acabam se apaixonando por outras pessoas e ficando em um relacionamento heterossexual forçado e sem química: isso é queerbating.
Se você é uma pessoa cisgênero heterossexual, não é necessário que você se esforce muito para ver relacionamentos que te representem na mídia – porque, sejamos sinceros: casais heterossexuais estão em todo lugar. Agora, se você é um jovem queer, membro da comunidade LGBTQIA+, se ver representado nas telinhas é algo bem mais difícil.
afinal, o que é queerbating?
Segundo Renato Miranda, coordenador de Marketing na BiUP Educação, o termo queerbating é “utilizado para se referir a uma ação pensada para “fisgar” o público queer, que são pessoas que não se classificam como heteronormativas.”, explica ele.
“A palavra “bait” em inglês significa isca, ou seja, o termo expressa exatamente a intenção de atrair a atenção do público LGBTQIA+ através de um conteúdo que não desagrade a parcela mais conservadora de uma determinada audiência.”, continua o especialista.
Esse tipo de conteúdo bastante nocivo, pois ilustra exatamente uma vontade controlada e comedida de mostrar conteúdos queer, muitas vezes apenas querendo vender a imagem de que a produção é “representativa”. “O termo é usado para criticar essa prática como uma tentativa de capitalizar e se aproveitar da esteticamente e indiretamente dos relacionamentos homoafetivos sem de fato entregar nenhuma representatividade LGBTQIA+.”, adiciona Renato.
Na mídia atual e na cultura pop os exemplos são vários. Um bem clássico é o beijo entre Betty e Veronica na primeira temporada de Riverdale, em que muitos fãs ficaram desconfortáveis – até porque além de queerbating, a cena pode ser considerada como uma espécie de fetichização entre mulheres lésbicas ou bissexuais. E fala sério: já estamos bem cansadas disso!
Outros programas criticados por queerbaiting citam a série House (Gregory House e James Wilson), Merlin (Arthur Pendragon e Merlin), Once Upon a Time (Emma Swan e Regina Mills), Sherlock (John Watson e Sherlock Holmes), The OC (Marissa Cooper e Alex Kelly) e Rizzoli & Isles – cujos escritores e elenco admitiram ter interpretado um subtexto lésbico entre as duas protagonistas, Jane Rizzoli e Maura Isles.
Renato também cita um caso específico: “Eu nunca irei saber se Hannibal Lecter se envolvia com Will Graham na série Hannibal, mas que havia uma química entre eles, havia! E pra ser bem sincero eu torci muito para que eles se envolvessem explicitamente.”, comenta ele.
Mas porque isso é comum na mídia?
Por meio do queerbating, escritores, produtores e criadores conseguem atrair o (expressivo!) mercado LGBTQIA+, e ao mesmo tempo consegue evitar qualquer reação de “estranhamento” de um possível mercado homofóbico.
No entanto, esse tipo de representação tem um péssimo efeito para o inconsciente social e para toda a comunidade queer que for consumir aquilo. Já que esta falta de representação real sugere que personagens LGBTQIA+ são menos importantes, além de fazer com que pareça que todos os relacionamentos não-heterossexuais são menos valiosos.
é possível “driblar” isso?
De acordo com Renato, apostar na representação verdadeira é o caminho. “Podemos influenciar com consciência e inclusão, mas tem que ser algo genuíno. A comunidade queer não quer inclusão a todo custo. Na verdade, qualquer tipo de ação similar a queerbating tem como raiz um interesse comercial.”, explica ele. “Seja para promoção pessoal ou de algum produto, ou seja, para se posicionar como parte apoiadora de uma determinada comunidade para não perder seguidores ou desagradar parte de uma audiência. Eu sempre digo que uma hora a verdade vem à tona.(…)“, finaliza.