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Opinião: nova era de Billie Eilish é arte, mas a reação foi machista

Yasmin Morais mostra como a reação à era “Happier Than Ever” evidencia o machismo que sexualiza mulheres

Opinião nova era de Billie Eilish é arte, mas a reação foi machista
Opinião nova era de Billie Eilish é arte, mas a reação foi machista (Créditos: foto - divulgação, arte - Rawpixel)

No dia 2 de maio, a todateen e diversos veículos de comunicação publicaram notas sobre o marco na carreira de Billie Eilish: uma mudança de era, consolidada por sua entrevista e ensaio para a capa da Vogue Britânica do mês. A cantora já havia mencionado para a GQ inglesa que estava se sentindo “presa” na persona que criou. Sendo assim, é compreensível a vontade de mudar, em estilo pessoal e musical. Entretanto, a resposta de vários internautas e veículos de comunicação, dentro e fora do Brasil, não foi falar sobre a mudança para “Happier Than Ever”, mas reforçar comentários sobre o corpo da artista de 19 anos, fotografada pela primeira vez com peças justas.

Tudo começou com o adeus à raiz verde, substituída por fios platinados em março, o que explica o uso de peruca no Grammy deste ano. Mas, apenas no primeiro domingo de maio o mundo percebeu que as roupas oversized também não faziam parte deste novo estilo, concebido para dar ainda mais destaque ao que ainda vem por aí: segundo a jornalista Laura Snapes, que entrevistou Billie para essa matéria da Vogue, uma música com gritos será lançada.

Definitivamente, estamos diante de uma nova fase da cantora que popularizou o ASMR (Resposta Sensorial Autônoma do Meridiano), porém, o assunto naquele domingo era apenas um: a sensualidade de Billie nas fotos clicadas por Caig McDean.

Yasmin Morais (@yasminescritora) é escritora, fundadora do primeiro projeto feminista de raiz e negro do Brasil (@vulvanegra), estudante de jornalismo e uma das responsáveis pela coluna “A Última Página”, aqui, na todateen. Segundo a ativista, estamos diante de diversas questões, mas a culpa definitivamente não é de Billie Eilish ou sua vontade de produzir uma nova era. “Billie não possui culpa, e suas roupas não a tornam culpada de nada. A sociedade na qual vivemos hiperssexualiza meninas desde a tenra infância, em países como o Brasil, a idade para que soframos o primeiro assédio está em torno dos 9 anos de idade. O que está a ocorrer com Billie trata-se do reflexo de nossa sociedade predatória. Faz-se necessário compreender que a questão está para além da cantora, mas sim, que reside na sexualização e discursos aos quais adolescentes e jovens são submetidas”.

Na verdade, a própria Billie já se posicionou sobre não ser a culpada pela sexualização que lhe submetem. O curta-metragem “Not My Responsability” foi produzido pela cantora e transmitido durante a última tour. No vídeo, a artista fala sobre ser alvo o tempo todo de comentários sobre seu corpo e estilo. “If I wear what is comfortable / I am not a woman / If I shed the layers / I’m a sl**” (tradução: “Se eu vestir o que é confortável / Não sou mulher / Se eu tirar algumas camadas / Sou vaga***”).

“Vivemos em uma sociedade patriarcal na qual mulheres tendem a ser exploradas com base em seu sexo, etnia, classe, imagem e discursos. Na Indústria Cultural, não ocorreria de modo diferente. Desde figuras como Marilyn Monroe à celebridades atuais como Millie Bobby Brown, mulheres na indústria do entretenimento e em diversos segmentos artísticos são socialmente coagidas à sexualização. Pois, para além de ser um viés imensamente lucrativo, serve ao discurso de submissão sexual feminina como empoderamento“, explica Morais.

A escritora afirma que existe um fenômeno chamado “countdown 18”, ou “contagem regressiva para os 18 anos”, quando uma jovem entra muito cedo para a indústria do entretenimento e a maioridade é aguardada com entusiasmo, já que a partir deste momento é socialmente aceito que ela protagonize cenas e ensaios fotográficos sexualizados. “Esta situação é recorrente e corrobora com conceitos como a cultura do estupro e a cultura da pedofilia. Por que é tão importante descobrir o que há sob as roupas de uma mulher? Por que desejam sempre o acesso total aos nossos corpos e intimidade?”.

o que é empoderamento?

O ato de ter usado roupas justas foi retratado no veículo de comunicação como um empoderamento da cantora, que já mencionou mais de uma vez escolher roupas largas por receio dos comentários que possam ser feitos caso optasse por caimentos justos. Certa vez, Billie foi clicada por paparazzis durante um compromisso cotidiano no verão, usando regata. Na ocasião, comentários sobre seu corpo dominaram a web. “Fiquei realmente ofendida”, disse Billie à Vogue sobre o ocorrido, reforçando que mesmo aqueles que tentaram lhe enaltecer não fizeram o correto.

Para Morais, estamos diante de uma estrutura com valores que tornam mulheres objetos o tempo todo. “A grande mensagem deve ser, em minha concepção, que a sexualização não é uma forma de empoderamento. Não temos poder real, quando nos concebem como objetos. E, apesar de sermos sexualizadas em todos os termos, existem discursos muito específicos que corroboram e incentivam esta sexualização predatória de jovens e adolescentes. Temos de estar atentos a esses discursos. Pois, a pressão social se reverte em inúmeros problemas de ordem psicológica. As meninas ainda são as maiores vítimas de transtornos alimentares e começam a odiar os seus corpos precocemente”.

A fundadora do Vulva Negra finaliza afirmando que o ensaio da cantora era um evento esperado pela sociedade machista querendo intensificar a sexualização, mas, o poder de Billie Eilish é exibido diariamente pela arte que inspira tantas meninas. “Considero o ‘Not My Responsibility’ um ato de coragem. A sociedade sempre deseja que sejamos precoces. Billie tem apenas 19 anos. Muitas questões interiores ainda precisam ser trabalhadas, e no futuro, penso que ela sentir-se-á ainda melhor dentro de sua própria pele. O corpo de Billie é único e especial, e nós sabemos que ela sempre foi mais do que a sua aparência. Gostaria que ela soubesse disso desde a adolescência, ao invés de ter sofrido com a terrível pressão estética que se sucedeu. Gostaria que todas as adolescentes soubessem disso. Somos mais do que apenas os nossos corpos. Somos mais do que a nossa aparência física. Cada menina importa“.

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